Não consigo dormir Deve ser do café que eu insisto em tomar Depois do jantar Ou então do jantar Que é preciso engolir quando o corpo diz não Sem qualquer razão Ou então dos problemas que eu teimo em complicar Há sempre gente em pior condição O miúdo das cautelas não reparou ao atravessar Um automóvel atirou-o ao chão Estou deitado na cama E apetece-me acelerar
Não consigo pensar Deve ser do cansaço de me ocupar demais De coisas banais Ou então é do vinho Não se deve beber fora das refeições Salvo raras excepções Ou então do bloqueio em volta do pensamento As ideias passam ao largo sem atracar A rapariga do xaile era um verdadeiro monumento Com monumentos não se pode falar Estou aqui no sofá E apetece-me evaporar
Conta-me uma história Só mais uma história Só mais uma história
Não consigo parar É talvez a lembrança da criança que eu fui Que ainda me dói Ou então a amargura De saber que não sou o herói que sonhei E que abandonei É talvez a loucura a envenenar-me a memória Gritando em surdina: recordar é viver Aquele velho no jardim também teve os seus sonhos de glória Vou ser parecido com ele quando envelhecer Ando às voltas de mim E apetece-me adormecer
Conta-me uma história Só mais uma história Só mais uma história